A IGREJA PRIMITIVA
A palavra igreja vem do grego ekklesia, que tem origem em kaleo ("chamo ou convosco"). Na literatura secular, ekklesia referia-se a uma assembléia de pessoas, mas no Novo Testamento (NT) a palavra tem sentido mais especializado. A literatura secular podia usar a apalavra ekklesia para denotar um levante, um comício, uma orgia ou uma reunião para qualquer outra finalidade. Mas o NT emprega ekklesia com referência à reunião de crentes cristãos para adorar a Cristo.
Que é a igreja? Que pessoas constituem esta "reunião"? Que é que Paulo pretende dizer quando chama a igreja de "corpo de Cristo"?
Para responder plenamente a essas perguntas, precisamos entender o contexto social e histórico da igreja do NT. A igreja primitiva surgiu no cruzamento das culturas hebraicas e helenística.
Fundada a Igreja
Quarenta dias depois de sua ressurreição, Jesus deu instruções finais aos discípulos e ascendeu ao céu (At 1.1-11). Os discípulos voltaram a Jerusalém e se recolheram durante alguns dias para jejum e oração, aguardando o ES, o qual Jesus disse que viria. Cerca de 120 pessoas seguidores de Jesus aguardavam.
Cinqüenta dias após a Páscoa, no dia de Pentecoste, um som como um vento impetuoso encheu a casa onde o grupo se reunia. Línguas de fogo pousaram sobre cada um deles e começaram a falar em línguas diferente da sua conforme o Espírito Santo os capacitava. Os visitantes estrangeiros ficaram surpresos ao ouvir os discípulo falando em suas próprias línguas. Alguns zombaram, dizendo que deviam estar embriagados (At 2.13).
Mas Pedro fez calar a multidão e explicou que estavam dando testemunho do derramamento do Espírito Santo predito pelos profetas do Antigo Testamento (AT) (At 2.16-21; Jl 2.28-32). Alguns dos observadores estrangeiros perguntaram o que deviam fazer para receber o Espírito Santo. Pedro disse: " Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para remissão dos vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo " (At 2.38). Cerca de 3 mil pessoas aceitaram a Cristo como seu Salvador naquele dia (Atos 2.41).
Durante alguns anos Jerusalém foi o centro da igreja. Muitos judeus acreditavam que os seguidores de Jesus eram apenas outra seita do judaísmo. Suspeitavam que os cristãos estavam tentando começar um nova "religião de mistério" em torno de Jesus de Nazaré.
É verdade que muitos dos cristãos primitivos continuaram a cultuar no templo (At 3.1) e alguns insistiam em que os convertidos gentios deviam ser circuncidados (At 15). Mas os dirigentes judeus logo perceberam que os cristãos eram mais do que uma seita. Jesus havia dito aos judeus que Deus faria uma Nova Aliança com aqueles que lhe fossem fiéis (Mt 16.18); ele havia selado esta aliança com seu próprio sangue (Lc 22.20). De modo que os cristãos primitivos proclamavam com ousadia haverem herdados os privilégios que Israel conhecera outrora. Não eram simplesmente uma parte de Israel - eram o novo Israel (Ap 3.12; 21.2; Mt 26.28; Hb 8.8; 9.15). "Os líderes judeus tinham um medo de arrepiar, porque este novo e estranho ensino não era um judaísmo estreito, mas fundia o privilégio de Israel na alta revelação de um só Pai de todos os homens." (Henry Melvill Gwatkin, Early Church History, pag 18).
a) A Comunidade de Jerusalém.
Os primeiros cristãos formavam uma comunidade estreitamente unida em Jerusalém após o dia de Pentecoste. Esperavam que Cristo voltasse muito em breve.
Os cristãos de Jerusalém repartiam todos os seus bens materiais (At 2.44-45). Muitos vendiam suas propriedades e davam à igreja o produto da venda, a qual distribuía esses recursos entre o grupo ( At 4.34-35).
Os cristãos de Jerusalém ainda iam ao templo para orar (At 2.46), mas começaram a partilhar a Ceia do Senhor em seus próprios lares (At 2.42-46). Esta refeição simbólica trazia-lhes à mente sua nova aliança com Deus, a qual Jesus havia feito sacrificando seu próprio corpo e sangue.
Deus operava milagres de cura por intermédio desses primeiros cristãos. Pessoas enfermas reuniam-se no templo de sorte que os apóstolo pudessem tocá-las em seu caminho para a oração (At 5.12-16). Esses milagres convenceram muitos de que os cristãos estavam verdadeiramente servindo a Deus. As autoridades do templo, num esforço por suprimir o interesse das pessoas na nova religião, prenderam os apóstolos. Mas Deus enviou um anjo para libertá-los (At 5.17-20), o que provocou mais excitação.
A igreja crescia com tanta rapidez que os apóstolos tiveram de nomear sete homens para distribuir víveres às viúvas necessitadas. O dirigente desses homens era Estevão, "homem cheio de fé e do Espírito Santo" (At 6.5). Aqui vemos o começo do governo eclesiástico. Os apóstolos tiveram de delegar alguns de seus deveres a outros dirigentes. À medida que o tempo passava, os ofícios da igreja foram dispostos numa estrutura um tanto complexa.
b) O Assassínio de Estevão.
Certo dia um grupo de judeus apoderou-se de Estevão e, acusando-o de blasfêmia, o levou à presença do conselho do sumo sacerdote. Estevão fez uma eloqüente defesa da fé cristã, explicando como Jesus cumpriu as antigas profecias referentes ao Messias que libertaria seu povo da escravidão do pecado. Ele denunciou os judeus como "traidores e assassinos" do filho de Deus (At 7.52). Erguendo os olhos para o céu, ele exclamou que via a Jesus em pé à destra de Deus ( At 7.55). Isso enfureceu os judeus, que o levaram para fora da cidade e o apedrejaram (At 7.58-60).
Esse fato deu início a uma onde de perseguição que levou muitos cristãos a abandonarem Jerusalém (At 8.1). Alguns desses cristãos estabeleceram-se entre os gentios de Samaria, onde fizeram muitos convertidos (At 8.5-8). Estabeleceram congregações em diversas cidades gentias, como Antioquia da Síria. A princípio os cristãos hesitavam em receber os gentios na igreja, porque eles viam a igreja como um cumprimento da profecia judaica. Não obstante, Cristo havia instruído seus seguidores a fazer "discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28.19). Assim, a conversão dos gentios foi "tão-somente o cumprimento da comissão do Senhor, e o resultado natural de tudo o que havia acontecido..." (Gwatkin,Early Church History, p. 56). Por conseguinte, o assassínio de Estevão deu início a uma era de rápida expansão da igreja.
c) Atividades Missionárias.
Cristo havia estabelecido sua igreja na encruzilhada do mundo antigo. As rotas comerciais traziam mercadores e embaixadores através da Palestina, onde eles entravam em contato com o evangelho. Dessa maneira, no livro de Atos vemos a conversão de oficiais de Roma (At 10.1-48), da Etiópia ( At 8.26-40), e de outras terras.
Logo depois da morte de Estevão, a igreja deu início a uma atividade sistemática para levar o evangelho a outras nações. Pedro visitou as principais cidades da Palestina, pregando tanto a judeus como aos gentios. Outros foram para a Fenícia, Chipre e Antioquia da Síria. Ouvindo que o evangelho era bem recebido nessas regiões, a igreja de Jerusalém enviou a Barnabé para incentivar os novos cristãos em Antioquia (At 11.22-23). Barnabé, a seguir, foi para Tarso em busca do jovem convertido Saulo (Paulo) e o levou para a Antioquia, onde ensinaram na igreja durante um ano (At 11.26).
Um profeta por nome Ágabo predisse que o Império Romano sofreria uma grande fome sob o governo do Imperador Cláudio. Herodes Agripa estava perseguindo a igreja em Jerusalém; Ele já havia executado a Tiago, irmão de João, e tinha lançado Pedro na prisão (At 12.1-4). Assim os cristãos de Antioquia coletaram dinheiro para enviar a seus amigos em Jerusalém, e despacharam Barnabé e Paulo com o socorro. Os dois voltaram de Jerusalém levando um jovem chamado João Marcos (At 12.25). Por esta ocasião, diversos evangelistas haviam surgido no seio da igreja de Antioquia, de modo que a congregação enviou Barnabé e Paulo numa viagem missionária à Ásia Menor (At 13-14). Esta foi a primeira de três grandes viagens missionárias que Paulo fez para levar o evangelho aos recantos longínquos do Império Romano.
Os primeiros missionários cristãos concentraram seus ensinos na Pessoa e obra de Jesus Cristo. Declararam que ele era o servo impecável e Filho de Deus que havia dado sua vida para expiar os pecados de todas as pessoas que depositavam sua confiança nele (Rm 5.8-10). Ele era aquele a quem Deus ressuscitou dos mortos para derrotar o poder do pecado (Rm 4.24-25; 1Co 15.17).
d) Governo Eclesiástico.
A princípio, os seguidores de Jesus não viram a necessidade de desenvolver um sistema de governo da Igreja. Esperavam que Cristo voltasse em breve, por isso tratavam os problemas internos à medida que surgiam - geralmente de um modo muito informal.
Mas o tempo em que Paulo escreveu suas cartas às igrejas, os cristãos reconheciam a necessidade de organizar o seu trabalho. O NT não nos dá um quadro pormenorizado deste governo da igreja primitiva. Evidentemente, um ou mais presbíteros presidiam os negócios de cada congregação (Rm 12.6-8; 1Ts 5.12; Hb 13.7,17,24), exatamente como os anciãos faziam nas sinagogas judaicas. Esses anciãos (ou presbíteros) eram escolhidos pelo Espírito Santo (At 20.28), mas os apóstolos os nomeavam (At 14.23). Por conseguinte, o Espírito Santo trabalhava por meio dos apóstolos ordenando líderes pra o ministério. Alguns ministros chamados evangelistas parecem ter viajado de uma congregação para outra, como faziam os apóstolos. Seu título significa "homens que manuseiam o evangelho". Alguns têm achado que eram todos representantes pessoais dos apóstolos, como Timóteo o foi de Paulo; outros supõem que obtiveram esse nome por manifestarem um dom especial de evangelização. Os anciãos assumiam os deveres pastorais normais entre as visitas desses evangelistas.
Algumas cartas do NT referem-se a bispos na igreja primitiva. Isto é um bocado confuso, visto que esses "bispos" não formavam uma ordem superior da liderança eclesiástica como ocorre em algumas igrejas onde o título é usado hoje. Paulo lembrou aos presbíteros de Éfeso que eles eram bispos (At 20.28), e parece que ele usa os termos presbítero e bispo intercambiavelmente (Tt 1.5-9). Tanto os bispos como os presbíteros estavam encarregados de supervisar uma congregação. Evidentemente, ambos os termos se referem aos mesmos ministros da igreja primitiva, a saber, os presbíteros.
Paulo e os demais apóstolos reconheceram que o ES concedia habilidades especiais de liderança a certas pessoas (1Co 12.28). Assim, quando conferiam um título oficial a um irmão ou irmã em Cristo, estavam confirmando o que o Espírito Santo já havia feito.
A igreja primitiva não possuía um centro terrenal de poder. Os cristãos entendiam que Cristo era o centro de todos os seus poderes (At 20.28). O ministério significava servir em humildade, em vez de governar de uma posição elevada (Mt 20.26-28). Ao tempo em que Paulo escreveu suas epístolas pastorais, os cristãos reconheciam a importância de preservar os ensinos de Cristo por intermédio de ministros que se devotavam a estudo especial, "que maneja bem a palavra da verdade" (2Tm 2.15). A igreja primitiva não oferecia poderes mágicos, por meio de rituais ou de qualquer outro modo. Os cristãos convidavam os incrédulos para fazer parte de seu grupo, o corpo de Cristo (Ef 1.23), que seria salvo como um todo. Os apóstolos e os evangelistas proclamavam que Cristo voltaria para o seu povo, a "noiva" de Cristo (Ap 21.2; 22.17). Negavam que indivíduos pudessem obter poderes especiais de Cristo para seus próprios fins egoístas (At 8.9-24; 13.7-12).
e) Padrões de Adoração.
Visto que os cristãos primitivos adoravam juntos, estabeleceram padrões de adoração que diferiam muito dos cultos da sinagoga. Não temos um quadro claro da adoração Cristã primitiva até 150 dC, quando Justino Mártir descreveu os cultos típicos de adoração. Sabemos que a igreja primitiva realizava seus serviços no domingo, o primeiro dia sa semana. Chamavam-no de "o Dia do Senhor" porque foi o dia em que Cristo ressurgiu dos mortos. Os primeiros cristãos reuniam-se no templo em Jerusalém, nas sinagogas, ou nos lares ( At 2.46; 13.14-16; 20.7-8). Alguns estudiosos crêem que a referência aos ensino de Paulo na escola de Tirano (At 19.9) indica que os primitivos cristãos às vezes alugavam prédios de escola ou outras instalações. Não temos prova alguma de que os cristãos tenham construído instalações especial para seus cultos de adoração durante mais de um século após o tempo de Cristo. Onde os cristãos eram perseguidos, reuniam-se em lugares secretos como as catacumbas (túmulos subterrâneos) de Roma.
Crêem os eruditos que os primeiros cristãos adoravam nas noites de domingo, e que seu culto girava em torno da Ceia do Senhor. Mas nalgum ponto os cristãos começavam a manter dois cultos de adoração no domingo, conforme descreve Justino Mártir - um bem cedo de manhã e outro ao entardecer. As horas eram escolhidas por questão de segredo e para atender às pessoas trabalhadoras que não podiam comparecer aos cultos de adoração durante o dia.
- Ordem do Culto:
Geralmente o culto matutino era uma ocasião de louvor, oração e pregação. O serviço improvisado de adoração dos cristãos no Dia de Pentecoste sugere um padrão de adoração que podia ter sido geralmente adotado. Primeiro, Pedro leu as Escrituras. Depois pregou um sermão que aplicou as Escrituras à situação presente dos adoradores (At 2.14-36). As pessoas que aceitavam a Cristo eram batizadas, seguindo o exemplo do próprio Senhor. Os adoradores participavam dos cânticos, dos testemunhos ou de palavras de exortação (1Co 14.26).
- A Ceia do Senhor:
Os primitivos cristãos tomavam a refeição simbólica da Ceia do Senhor para comemorar a Última Ceia, na qual Jesus e seus discípulos observaram a tradicional festa judaica da Páscoa. Os temas dos dois eventos eram os mesmo. Na Páscoa os judeus regozijavam-se porque Deus os havia libertado de seus inimigos e aguardavam com expectação o futuro como filhos de Deus. Na Ceia do Senhor, os cristãos celebravam o modo como Jesus os havia libertado do pecado e expressavam sua esperança pelo dia quando Cristo voltaria (1Co 11.26). A princípio, a Ceia do Senhor era uma refeição completa que os cristãos partilhavam em suas casas. Cada convidado trazia um prato para a mesa comum. A refeição começava com oração e com o comer de pedacinhos de um único pão que representava o corpo partido de Cristo. Encerrava-se a refeição com outra oração e a seguir participavam de uma taça de vinho, que representava o sangue vertido de Cristo.
Algumas pessoas conjeturavam que os cristãos estavam participando de um rito secreto quando observavam a Ceia do Senhor, e inventaram estranhas histórias a respeito desses cultos. O imperador Trajano proscreveu essas reuniões secretas por volta do ano 100 dC. Nesse tempo os cristãos começaram a observar a Ceia do Senhor durante o culto matutino de adoração, aberto ao público.
- Batismo:
O batismo era um acontecimento comum da adoração cristã no templo de Paulo (Ef 4.5). Contudo, os cristãos não foram os primeiros a celebrar o batismo. Os judeus batizavam seus convertidos gentios; algumas seitas judaicas praticavam o batismo como símbolo de purificação, e João Batista fez dele uma importante parte de seu ministério. O NT não diz se Jesus batizava regularmente seus convertidos, mas numa ocasião, pelo menos, antes da prisão de João, ele foi encontrado batizando. Em todo o caso, os primitivos cristãos eram batizados em nome de Jesus, seguindo o seu próprio exemplo (Mc 1.10; Gl 3.27).
Parece que os primitivos cristãos interpretavam o significado do batismo de vários modos - como símbolo da morte de uma pessoa para o pecado (Rm 6.4; Gl 2.12), da purificação de pecados (At 22.16; Ef 5.26), e da nova vida em Cristo (At 2.41; Rm 6.3). De quando em quando toda a família de um novo convertido era batizada (At 10.48; 16.33; 1Co 1.16), o que pode significar o desejo da pessoa de consagrar a Cristo tudo quanto tinha.
- Calendário Eclesiástico:
O NT não apresenta evidência alguma de que a igreja primitiva observava quaisquer dias santos, a não ser sua adoração no primeiro dia da semana (At 20.7; 1Co 16.2; Ap 1.10). Os cristãos não observam o domingo como dia de descanso até ao quarto século de nossa era, quando o imperador Constantino designou-o como um dia santo para todo o Império Romano. Os primitivos cristãos não confundiam o domingo com o sábado judaico, e não faziam tentativa alguma para aplicar a ele a legislação referente ao sábado.
O historiador Eusébio diz-nos que os cristãos celebravam a Páscoa desde os tempos apostólicos; 1Co 5.6-8 talvez se refira a uma Páscoa cristã na mesma ocasião da Páscoa judaica. Por volta do ano 120 dC, a igreja de Roma mudou a celebração para o domingo após a Páscoa judaica enquanto a igreja Ortodoxa Oriental continuou a celebrá-la na Páscoa Judaica.
f) Conceito do NT sobre a Igreja.
É interessante pesquisar vários conceitos de igreja no NT. A Bíblia refere-se aos primeiros cristãos como família e templo de Deus, como rebanho e noiva de Cristo, como sal, como fermento, como pescadores, como baluarte sustentador da verdade de Deus, de muitas outras maneiras. Pensava-se na igreja como uma comunidade mundial única de crentes, da qual cada congregação local era afloramento e amostra. Os primitivos escritores cristãos muitas vezes se referiam à igreja como o "corpo de Cristo" e o "novo Israel". Esses dois conceitos revelam muito da compreensão que os primitivos cristãos tinha da sua missão no mundo.
- O Corpo de Cristo:
Paulo descreve a igreja como "um só corpo em Cristo" (Rm 12.5) e "seu corpo" (Ef 1.23). Em outras palavras, a igreja encerra numa comunhão única de vida divina todos os que são unidos a Cristo pelo Espírito Santo mediante a fé. Esses participam da ressurreição (Rm 6.8), e são a um tempo chamados e capacitados para continuar seu ministério de servir e sofrer para abençoar a outros (1Co 12.14-26). Estão ligados numa comunidade que personifica o reino de Deus no mundo.
Pelo fato de estarem ligados a outros cristãos, essas pessoas entendiam que o que faziam com seus próprios corpos e capacidades era muito importante (Rm 12.1; 1Co 6.13-19; 2Co 5.10). Entendiam que as várias raças e classes tornam-se uma em Cristo (1Co 12.3; Ef 2.14-22), e deviam aceitar-se e amar-se uns aos outros de um modo que revelasse tal realidade.
Descrevendo a igreja com o corpo de Cristo, os primeiros cristãos acentuaram que Cristo era o cabeça da igreja (Ef 5.23). Ele orientava as ações da igreja e merecia todo o louvor que ela recebia. Todo o poder da igreja para adorar e servir era dom de Cristo.
- O Novo Israel: Os primitivos cristãos identificavam-se com Israel, povo escolhido de Deus. Acreditavam que a vinda e o ministério de Jesus cumpriram a promessa de Deus aos patriarcas (Mt 2.6; Lc 1.68; At 5.31), e sustentavam que Deus havia estabelecido uma Nova Aliança com os seguidores de Jesus (2Co 3.6; Hb 7.22, 9.15).
Deus, sustentavam eles, havia estabelecido seu novo Israel na base da salvação pessoal, e não em linhagem de família. Sua igreja era uma nação espiritual que transcendia a todas as heranças culturais e nacionais. Quem quer que depositasse fé na Nova Aliança de Deus, rendesse a vida a Cristo, tornava-se descendente espiritual de Abraão e, como tal, passava a fazer parte do "novo Israel" (Mt 8.11; Lc 13.28-30; Rm 4.9-25; Gl 3-4; Hb 11-12).
-Características Comuns: Algumas qualidades comuns emergem das muitas imagens da igreja que encontramos no NT. Todas elas mostram que a igreja existe porque Deus trouxe à existência. Cristo comissionou seus seguidores a levar avante a sua obra, e essa é a razão da existência da igreja.
As várias imagens que o NT apresenta da igreja acentuam que o Espírito Santo a dota de poder e determina a sua direção. Os membros da igreja participam de uma tarefa comum e de um destino comum sob a orientação do Espírito.
A igreja é uma entidade viva e ativa. Ela participa dos negócios deste mundo; demonstra o modo de vida que Deus tenciona para todas as pessoas, e proclamam a Palavra de Deus para a era presente. A unidade e a pureza espirituais da igreja estão em nítido contraste com a inimizade e a corrupção do mundo. É responsabilidade da igreja em todas as congregações particulares mediante as quais ela se torna visível, praticar a unidade, o amor e cuidado de um modo que mostre que Cristo vive verdadeiramente naqueles que são membros do seu corpo, de sorte que a vida deles é a vida de Cristo neles.
Fonte: O Mundo do Novo Testamento - Editora Vida
HISTÓRIA DA IGREJA CRISTÃ EVANGÉLICA
Os cristãos evangélicos consideram que a sua história começa na eternidade com Deus Pai, Filho e Espírito Santo e, depois do curso do tempo, retoma esta mesma eternidade, porque a esperança futura de “novos céus e nova terra em que habita a justiça” perpassa todo o cristianismo bíblico. A Igreja de Jesus Cristo será reunida a Ele por toda a eternidade porque faz parte de Cristo como Seu corpo, do qual Ele é a cabeça. É no seio da Trindade que no princípio o homem é criado à imagem e semelhança do Criador. O homem e a mulher têm os traços de Deus. Foram criados para viverem na intimidade do Senhor do Universo.
Ou somos produto da matéria e da energia segundo o acaso e o acidente, e temos neles a divindade suprema que produziu tudo o que conhecemos e o que não conhecemos no infinitamente grande do universo e no infinitamente pequeno dos elementos do átmo; ou somos criação de um Deus pessoal que a Si mesmo se deu a conhecer na pessoa de Jesus Cristo. Segundo as evidências disponíveis e em fé assumimos de espírito, alma e corpo inteiros a segunda opção e não consideramos sequer a primeira uma alternativa válida. Há muita coisa que ainda não sabemos, existem muitas perguntas em aberto; mas sabemos o suficiente para acreditar em Jesus Cristo e, segundo o Seu ensino, em toda a Bíblia, como Palavra de Deus.
Como cristãos evangélicos consideramos a Bíblia digna de todo o crédito, em cada um dos testamentos, na sua vertente histórica; para lá do facto essencial de ser o nosso fundamento único de fé, de doutrina e de prática. Para nós a Bíblia é inspirada, não ditada, por Deus e inerrante em todo o seu conteúdo. Palavra de Deus nas palavras dos homens. Temos uma posição claramente fundamentalista, embora esta posição não possa nem deva ser de modo algum confundida com qualquer tipo de intolerância e muito menos de terrorismo. Respeitamos todas as confissões religiosas mas consideramos que todas elas são apenas a expressão humana da busca de Deus, enquanto na Bíblia temos a revelação do próprio Deus que em carne e osso se manifestou entre nós e no qual conhecemos Deus de modo pessoal, sendo que através d’Ele recebemos a presença do Espírito Santo em nós tornando-nos templos nos quais Ele habita. Como revelação de Deus a Bíblia também nos dá uma panorâmica e análise da busca do homem por Deus ao longo dos tempos que é, em si, tantas vezes, resultado da negação do verdadeiro e genuíno ser divino. Porque o homem recusa o Deus verdadeiro inventa para si ídolos que mais não são do que a deificação da criação e nela de si mesmo. Na Bíblia Deus não é confundido com a criação nem um ser longínquo, distante e indiferente para com a humanidade que criou. No texto sagrado da Bíblia Deus é pessoal, existente em três pessoas distintas – Pai, Filho e Espírito Santo.
O Criador de todas as coisas não foi apanhado de surpresa com a desobediência do homem. Desde a eternidade o plano de redenção do homem estava determinado e delineado. No Jardim do Éden Deus revelou o proto-evangelho de que da semente da mulher haveria de nascer Aquele que feriria a cabeça da serpente.
A História da salvação contida no Velho Testamento é também a História da Igreja Cristã Evangélica. Deus escolheu em Abraão um povo do qual haveria de nascer o Salvador. No patriarca, segundo o decreto divino, seriam abençoadas todas as nações da Terra. A Igreja de Jesus Cristo é constituída por homens e mulheres de todas as nações, de todos os povos, de todas as línguas. Como hoje se diz ela é multicultural, mas na sua diversidade encontramos a singularidade de ser chamado pelo nome do Altíssimo, o nome que é sobre todo o nome.
Desde a Mesopotâmia, passando pelo Egipto, e atravessando os grandes impérios Babilónico, Persa, Medo-Persa, Grego e Romano, chegamos à Palestina de há dois mil anos atrás, quando os anjos anunciaram o nascimento de Jesus Cristo. Ele é o fundador e o edificador da Igreja. É sobre a pedra que é Ele mesmo que a Sua Igreja, que é o Seu corpo, está sendo construída. Segundo o Seu decreto, as portas do Inferno não prevalecerão contra ela. Jesus Cristo é o cerne da Bíblia e o foco da História. Para Ele toda a História aponta e n’Ele se concentra toda a expectativa histórica da Bíblia.
Jesus Cristo é Deus entre nós. Deus invadiu a História e habitou neste planeta como criatura. O Criador assumiu a forma da criação e viveu entre ela sentindo todo o peso da sua queda e dando a conhecer todo o seu esplendor em obediência e dependência do Pai, na unção e no poder do Espírito Santo. Este é um mistério singular. Esta é a substância do evangelho. O próprio Deus que na Sua essência estabelece o bem e o mal, o certo e o errado, a verdade e a mentira, a vida e a morte, a santidade e o pecado; que determinou as consequêncais da queda; veio como homem, vivendo como humano, obedecendo em tudo até à morte e morte de cruz à vontade do Pai e aí satisfez a justiça de Deus para que o homem fosse perdoado. Na cruz se beijaram o amor e a justiça de forma absoluta. Todo o amor de Deus e toda a justiça de Deus estão reunidas e expressas na cruz de Jesus Cristo.
Jesus Cristo, o Verbo, o Logos, o Filho de Deus encarnou, viveu entre os homens, morreu, ressuscitou, ascendeu aos céus e prometeu que voltaria uma segunda vez para encerrar definitivamente esta era e dar início a “novos céus e nova terra em que habitará a justiça para sempre”. A missão da Sua Igreja disseminada e infiltrada em todo o mundo, é tornar conhecido este plano, anunciar as boas novas do evangelho “que é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê”, admoestar os homens a reconciliarem-se com Deus e a viver em obediência aos mandamentos que o Seu edificador lhe determinou. A exigência de vida é a perfeição de mãos dadas com a graça que é o favor de Deus que nos aceita tal e qual nós somos, para que por Jesus Cristo nos tornemos como Ele é em nosso carácter.
A Igreja de Jesus Cristo é católica e apostólica, mas não é romana, bizantina, greja, ocidental, oriental, americana ou africana. Na diversidade própria de cada cultura há uma unidade na Palavra e no Espírito.
A Igreja de Jesus surgiu no meio de uma profunda oposição e perseguição, sem nenhuma conotação com o poder religioso e político. A Igreja cresceu e estendeu-se segundo o mandamento da Grande Comissão entregue pelo Salvador. O poder do Espírito Santo vence toda e qualquer oposição e uma a uma vão caindo todas as barreiras e obstáculos ao progresso do Evangelho. Levantam-se dificuldades internas que procuram minar a pureza da doutrina principalmente no que diz respeito à natureza triúna de Deus e da identidade divina de Jesus Cristo. Segundo a supervisão do Espírito Santo a verdade por Ele revelada na Bíblia prevalece contra todos os ataques.
A constantinização da Igreja tornando-a refém do poder político e mais tarde procurando controlar o poder político e viver na dependência das suas benesses económicas, acaba por subverter a sua essência. Em vez das marcas da humildade e do serviço, passamos a encontrar a sobranceria, a opulência, a corrupção, a sede do poder, a prepotência e a violência. Em vez de uma genuína e autêntica conversão do coração a Jesus, o cristianismo torna-se nominal, cultural, mera referência sociológica. Em vez do novo nascimento em que pelo poder do Espírito se é transformado numa nova criação, em filho de Deus, passamos a ter uma adesão a uma organização de onde se pode obter vantagens económico-sociais, ou onde se escapa ao ostracismo senão mesmo a discriminação social.
A Idade Média é marcada pelo obscurantismo em que a própria Palavra de Deus é vedada à leitura do povo e até dos líderes, em que o culto se transforma em ritos mecânicos dos quais a população é mero assistente porque nem sequer entende a língua em que é realizado. Introduzem-se doutrinas humanas que não têm fundamento nas Escrituras. Promove-se o sincretismo com as religiosidades e espiritualidades populares pagãs.
Em todo o tempo há um remanescente que não se deixa aprisionar pelas heresias e pelos desvios da são doutrina bíblica. Vários são os percursores de uma reforma que se tornava urgente como foi o caso de John Wycliff (c. 1324-1384), de João Huss (1369-1415) e de Jerónimo Savonarola (1452-1498). Muitos deles foram silenciados pela força e enfrentaram a morte, até que Deus usa Martinho Lutero para que algumas das verdades evangélicas essenciais sejam afirmadas publicamente e produzam uma verdadeira revolução social, cultural, política e, acima de tudo e em primeiro lugar, espiritual. Só a Escritura, só a Graça, só a Fé – eis o lema da Reforma protestante ao qual se pode juntar ainda a convicção de uma Igreja sempre em reforma, ou seja, sempre na procura da verdade bíblica. Esta última tendência virá a originar novas reformas dentro da própria reforma, como é o caso da reforma radical que vem a pugnar pela separação da Igreja do Estado; pela conversão genuína identificada pelo baptismo por imersão em idade adulta para a pertença e integração na Igreja de Jesus, sem qualquer forma de coacção ou de nominalismo produzido pelo baptismo infantil; pelo pacifismo e recusa de quaisquer formas de guerras político-religiosas. Esta reforma acaba por experimentar uma forte oposição dos grupos reformados que ainda mantiveram vínculos com doutrinas e práticas existentes no catolicismo romano particularmente no que diz respeito à relação de dependência do Estado.
Recorremos a uma excelente obra sobre a História da Teologia Cristã publicada pela Editora Vida, da autoria de Roger Olson:
“O conjunto total dos reformadores protestantes e de seus seguidores no século XVI pode ser dividido em duas categorias principais: a Reforma magisterial e a Reforma radical. Radicalsignifica, simplesmente, ‘voltar às raízes’ e é lógico que todos os protestantes pretendiam recuperar o verdadeiro evangelho do NT, livrando-o das partes da tradição medieval que achassem que o restringiam e suprimiam. Entretanto, o grupo divergente, de reformadores protestante, mais radical do que os demais, foi classificado ‘Reforma radical’ ou simplesmente ‘protestantes radicais’ por causa de suas características comuns’. (…) A Reforma radical inclui todos os protestantes da Europa no século XVI que acreditavam na separação entre a igreja e o estado, renunciavam à coerção nas questões da crença religiosa, rejeitavam o baptismo infantil em favor do baptismo dos crentes (também chamado baptismo no Espírito) e enfatizavam a experiência da regeneração (‘nascer de novo’) pelo Espírito de Deus mais do que a justificação forense. Eles evitavam magistrados cristãos e, em geral, procuravam viver o mais longe possível da sociedade. Alguns fundaram comunidades cristãs. A maioria adoptou o pacifismo cristão e um modo de vida singelo. Alguns rejeitavam o treinamento teológico formal e os clérigos profissionais. Todos enfatizavam o viver cristão prático mais do que os credos e as confissões de fé doutrinária.” (OLSON, Roger. História da Teologia Cristã, Editora Vida, pp. 425, 426)
A designação “protestante” surgiu em 1529, após a segunda dieta de Espira, onde os príncipes luteranos do Sacro Império haviam demonstrado o seu “protesto” contra as decisões imperiais que pretendiam restringir a liberdade religiosa do movimento reformista. Por sua vez o termo evangélico nasce entre os protestantes na formação da Liga Evangélica de Esmalcada – criada para defender os interesses dos principados protestantes contra o movimento católico contra-reformista liderado por Carlos V. Esta terminologia é menos agressiva do ponto de vista sociológico que entre nós sempre viu o protestantismo de soslaio, no entanto verifica-se um grande oportunismo por parte de determinados grupos que se servem dele e da sua abrangência de diversidade sem respeitarem os seus traços essenciais bíblicos trazidos de volta pela reforma e pelos movimentos de renovação que os desenvolveram e aprofundaram.
Os grandes lemas da Reforma que de forma brilhante sintetizam uma parte essencial do cristianismo bíblico, do evangelho de Jesus Cristo, são : Sola Gratia, Sola Fides eSola Scriptura (somente a graça, somente a fé, somente a Escritura), que condensam três princípios segundo o qual a reconciliação e a relação do homem com Deus só podem ser alcançados por meio do favor divino e nunca por nunca ser através das obras, pela fé na obra expiatória realizada por Jesus Cristo segundo as Escrituras, única regra de fé e prática. Um dos textos bíblicos que traduz esta essência de forma contundente foi escrito pelo apóstolo Paul o aos Efésios: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie.” (Efésios 2:8,9). No entanto a doutrina bíblica não desvaloriza o lugar das atitudes e das acções como resultado da salvação. É o mesmo apóstolo que de seguida escreve: “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas.” (Efésios 2:10). Daí que as Igrejas evangélicas tenham como prioridade a proclamação do evangelho da salvação pela graça mediante a fé segundo a Escritura, e como consequência o ensino que visa o desenvolvimento da fé numa prática consentânea, bem como a implantação de uma acção social abrangente.
Desta forma uma das características essenciais do movimento reformado protestante e evangélico é a Bíblia traduzida para as línguas vernáculas de tal forma que o povo a possa ler, analisar, reflectir, interpretar e viver de acordo com a iluminação do Espírito, procurando sempre a interpretação dentro do próprio contexto bíblico, ou seja, a Bíblia a interpretar-se a si própria. O livre exame e uma interpretação no seu contexto bíblico considerando ainda o enquadramento histórico-cultural, sem deixar que este comprometa o primeiro, sempre foi uma marca distintiva da Igreja cristã. Desde o dia de Pentecostes o impulso do Espírito foi no sentido de que as maravilhas de Deus fossem veiculadas em todas as línguas, para todos os povos em todas as geografias num genuíno movimento intercultural e multicultural. A invenção da imprensa por Gutemberg em 1456, acaba por ser, na providência divina e não por mera casualidade histórica, um instrumento decisivo na disseminação do texto sagrado. Hoje em dia a Bíblia está amplamente disponível através dos meios mais modernos de comunicação, como é o digital.
O movimento espiritual saído da Reforma acaba por desenvolver-se segundo grandes linhas de força das quais se destaca a separação da Igreja do Estado, a filiação cristã ligada à experiência cristã assumida em consciência e assumida publicamente no baptismo por imersão em idade adulta em vez de uma confissão meramente nominal e cultural, uma atitude mais assumida da propagação do evangelho tanto interna como externa através de agências missionárias, um governo eclesial cada vez mais centrado na comunidade local, a santidade de vida nos valores éticos e nos costumes em intimidade com Deus, o serviço dos mais desfavorecidos, o despojamento da imagem exterior de opulência nos templos e paramentos, uma liturgia cada vez menos formal e rígida para uma celebração espontânea, uma fé não apenas racional mas também emocional e afectiva. Assim na Inglaterra da Igreja Anglicana existem desdobramentos para os puritanos, congregacionais, quacres, metodistas, anabaptistas e baptistas. Na Alemanha do luteranismo para o pietismo, morávios e irmãos. Nos Estados Unidos os pentecostais. Entre um calvinismo predeterminista radical e um arminianismo do livre-arbítrio e da liberdade humana. Claro que estes esquemas não traduzem a riqueza das dinâmicas muito mais intrincadas, sempre em busca de uma identidade cada vez mais próxima da Igreja do primeiro século também designada de primitiva, ou seja a Igreja apostólica que Jesus funda, emana do dia de Pentecostes e continua a ser edificada segundo a Bíblia.
O mover do Espírito Santo continua a produzir os seus resultados na Igreja de Jesus de modo a arrebatá-la do conformismo, da estagnação, da mornidão espiritual, da subserviência e dependência do poder do Estado político-social, e numa busca intensa da santidade e da proclamação do Evangelho como poder de Deus para salvação e transformação de todo o que crê. É assim que surgem despertamentos espirituais durante os séculos dezoito, dezanove e vinte que estão na origem das principais denominações protestantes e evangélicos e que são uma acção do Espírito contrária à tendência da fossilização da espiritualidade cristã nominal. É nesta dinâmica que surgem pessoas como John Wesley (1703-1791), Jonathan Edwards (1703-1758), George Whitefield (1714-1770), Charles Spurgeon (1834-1892), Dwight Moody (1837-1899), Charles Finney (1792-1875), William Seymour (1870-1922).
Se a Igreja de Jesus Cristo está a par do seu tempo pode-se também que algumas vezes o antecipa. Se a sociedade coloca desafios à Igreja, a Igreja não tem deixado de interpelar o seu tempo com os desafios sempre presentes da pessoa de Jesus Cristo e do Seu evangelho. É isto que vemos na modernidade e na pós-modernidade mais próximos de nós com a Reforma protestante e com o avivamento pentecostal. Os perigos continuam a espretar a Igreja na sua identificação com Jesus Cristo e a Igreja do primeiro século. O desafio continua a ser permanente de respeitar a Bíblia como Palavra de Deus. O liberalismo teológico que pretende desmistificar a Bíblia considerando mito tudoo que se prende com a manifestação do sobrenatural, contrariado pelo fundamentalismo que defende a inerrância bíblica, o essencial do relato bíblico da criação e nela da criação especial do homem à imagem e semelhança de Deus, da queda do homem pela desobediência e rebeldia, do pecado original que corrompeu a natureza humana, do nascimento virginal de Jesus Cristo, da Sua morte substitutiva e expiatória sem a qual não é possível ser salvo, a ressurreição corpórea, a ascenção física e visível aos céus, a realidade dos milagres na soberania divina e na fé do crente, a segunda vinda de Cristo, no juízo final, no céu e no inferno. Estes dois grupos estão organicamente identificados no Conselho Mundial das Igrejas ecuménico e na Aliança Evangélica Mundial e no diálogo inter-religioso.
Em Portugal podemos considerar João Ferreira de Almeida (1628-1691) como o reformador português, em virtude da sua tradução da Bíblia que é, sem sombra de dúvida, o maior de todos os best-sellers em termos de venda e, certamente, de leitura e influência espiritual.
As primeiras comunidades protestantes são de emigrantes do norte da Europa, principalmente ingleses e os missionários que rumam a Portugal em sucessivos momentos vêm do norte da Europa (Escócia, Inglaterra, Suécia, Suíça e Holanda). Num momento subsequente é interessante a influência que vem do Brasil particularmente através de emigrantes portugueses que acabam por retornar, certamente devido à maior abertura deste aos movimentos reformados e à ausência da repressão da contra-reforma e da inquisição católica romana.
Sobre o começo das denominações evangélicas em Portugal citamos a obra de Herlânder Felizardo História dos Baptistas em Portugal, na qual se lê:
A primeira igreja evangélica em solo português foi a Igreja Reformada Alemã, fundada em Lisboa em 1641. Seguiram-se a Igreja Luterana Alemã, substituída pela Igreja Reformada Alemã em 1761, e a Igreja Anglicana de língua inglesa em 1871. Denominacionalmente temos a Igreja Episcopal Lusitana em 1868, a Presbiteriana em 1870, a Metodista em 1871, os Irmãos em 1877 e a Congregacional em 1880. A primeira igreja Baptista só viria a ser organizada em 1888.
Referimos e citamos o livro “Os Evangélicos em Portugal da autoria do missionário em Portugal Gerald Carl Ericson, editado pelo Núcleo:
Em 1641 uma igreja reformada holandesa era estabelecida em Lisboa e em 1642 o rei D. João IV de Portugal assinou um tratado com Carlos I de Inglaterra através do qual os súbditos britânicos residentes em Portugal tinham garantida a sua liberdade de consciência.
Um notável reformador português, que recebeu a sua educação teológica na Holanda e veio a ser o primeiro português a receber a ordenação para ministro do Evangelho, de seu nome João Ferreira de Almeida (1628-1691) deu o seu contributo máximo na preparação da primeira tradução do Novo Testamento para a língua portuguesa, a partir do original grego. Em 1670 a tradução estava concluída, e onze anos mais tarde foi publicada (João Ferreira de Almeida tinha nessa altura 53 anos).
Almeida morreu antes de completar a tradução do Velho Testamento do original hebraico. No entanto, ainda conseguiu completar a tradução de Génesis a Ezequiel enquanto estava em Java. Só em 1819 é que a Bíblia foi integralmente publicada em português.
(ERICSON , Gerald Carl. Os Evangélicos em Portugal. Núcleo , Queluz, Abril 1984, pp. 16,17)
A difusão de toda a série de reformas ao longo do século dezoito não veio alterar de modo sensível a situação religiosa em Portugal. Houve é certo alguns casos individuais de adopção da fé protestante. A existência de um primeiro cemitério protestante em 1774 é disso prova incontestável. Contudo, o panorama geral dessa época é francamente sombrio. Na generalidade, as pessoas não tinham acesso directo às Escrituras. Não havia liberdade de reunião para os evangélicos que compartilhassem a mesma fé. Não se levantaram vozes a defender a liberalização de reformas religiosas num sentido positivo.
(ERICSON, Gerald Carl. Os Evangélicos em Portugal. Núcleo , Queluz, Abril 1984, pp. 19)
O século dezanove em Portugal correspondeu a um período de iniciativa missionária, aliás como em muitas outras partes do mundo. No entanto, Portugal teve um começo muito mais lento do que a maior parte dos outros países, sobretudo por causa do ambiente de repressão religiosa herdada do passado, cujos efeitos obscurantistas perpetuavam-se ainda naquela altura.
A Inquisição foi oficialmente extinta em Portugal em 1821. Nove anos mais tarde Almeida Garrett publicou “Portugal na Balança da Europa” em que ele claramente referiu a perda grande que Portugal sofreu em não ter um maior contacto com as influências liberalizantes da Reforma.
As forças liberais por volta do ano de 1830 chegaram mesmo a expulsar as ordens religiosas católicas romanas e confiscaram-lhes os bens. No entanto, o país ainda não estava pronto para receber uma influência evangélica. O único trabalho digno de menção na primeira terça parte do século dezanove foi a fundação da agência da Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira (1809). Alguns agentes da Sociedade Bíblica percorreram Portugal, deixando quantidades apreciáveis de Bíblias em áreas mais ou menos afastadas da capital, como por exemplo o Alentejo. Não houve o estabelecimento de igrejas.
(ERICSON, Gerald Carl. Os Evangélicos em Portugal. Núcleo , Queluz, Abril 1984, pp. 19,20)
Damos a palavra ao Dr. David Valente sobre o percursor do protestantismo português na Ilha da Madeira:
O protestantismo chega a Portugal com Robert Reid Kalley, médico escocês, que aporta na Madeira em Outubro de 1838. Na Madeira funda escolas primárias com o fito de ensinar a ler a Bíblia, que aliás era o livro de texto desses estabelecimentos, cria um pequeno hospital, prega o Evangelho, traduz e escreve hinos, organiza a primeira comunidade presbiteriana portuguesa e ordena presbíteros e diáconos.
Em 1843 iniciam-se as perseguições com o encerramento das escolas, com proibição de que Kalley falasse sobre assuntos de religião, com a prisão de Kalley por cinco meses e com a intimação, perseguição e prisão dos calvinistas madeirenses, uma das quais, Maria Joaquina Alves, foi condenada à morte por apostasia, heresia e blasfémia. Tal sentença foi revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
As perseguições atingem o seu auge em 9 Agosto de 1846, data em que as forças católicas romanas estavam determinadas a erradicar de vez o calvinismo da Madeira. Nesse dia, sob a orientação do cónego Teles, a casa de Kalley é assaltada, a sua biblioteca queimada e os crentes madeirenses procurados em suas casas, espancados, perseguidos e presos. Kalley e mais de um milhar de protestantes logra escapar a esta perseguição e fugir da ilha da Madeira em barcos ingleses que se dirigiam para Trindade (no “William” fugiram 200 pessoas, no “Lord Seaton” 500, e muitas noutros barcos em Agosto, Setembro e Outubro de 1846). Ainda existem na ilha descendentes dos calvinistas de Kalley, como é o caso do irmão Jacinto Cláudio Gouveia, presidente da assembleia do Conselho Presbiteriano da Região da Madeira.
Depois de 1846 a Igreja Evangélica Presbiteriana na Madeira entra na clandestinidade, havendo poucas informações relativas ao período entre 1846 e 1876. (David Valente -Secretário Geral da Igreja Presbiteriana; Portugal Evangélico, Novembro, Ano LXXXVII, n.º 931, pp. 15,16).
O Dr. Robert Kalley, escocês nascido nos subúrbios de Glasgow e que se converteu a Cristo do agnosticismo, membro da Igreja Escocesa Livre a seguir à sua dramática expulsão da Madeira e a um período de muitos meses na Escócia e Inglaterra, passa dois anos em Malta, viaja extensivamente na Terra Santa, passa algum tempo com os madeirenses em Illinois, por fim desloca-se para o Brasil até à sua aposentação quase vinte e dois anos depois, onde estabelece a primeira igreja congregacional e, segundo Gerald Ericson, acaba por ter contacto com os futuros fundadores do movimento dos Irmãos e as Igrejas Congregacionais em Portugal.
“(...) Richard e Cathryn Holden chegaram do Brasil, onde tinham representado a Igreja Episcopal da Escócia e tinhamdesfrutado da comunhão com o Dr. Robert Kalley no Rio de Janeiro. O Sr. Holden teve também a oportunidade de passar algum tempo a viajar com J. N. Darby em Inglaterra. Ora Darby ficou como o fundador doutrinário do movimento dos irmãos. Eventualmente os Holden uniram-se aos Irmãos e foram os instrumentos usados para a fundação da primeira igreja dos Irmãos em Portugal, que é agora conhecida como a Igreja das Amoreiras, em Lisboa. Isto aconteceu em 1877. (Ericson, Gerald Carl. Os Evangélicos em Portugal, Núcleo, Queluz, Abril 1984, p. 33)
O trabalho do Dr. Robert Kalley no estabelecimento da primeira igreja congregacional no Brasil continua a assumir um lugar de relevo nas conversas mantidas com os pastores congregacionais portugueses. A igreja-mãe dos congregacionais, a “Igreja Fluminense” no Rio de Janeiro organizou a Missão Evangelizadora do Brasil e Portugal vinte e quatro anos após o derradeiro ano de ministério do Dr. Kalley nessa igreja. Muito embora a data dessa missão (1890) seja remota, há no entanto na geração actual dos obreiros congregacionais alguns que beneficiam do seu apoio financeiro depois de 1947. (...) A primeira igreja verdadeiramente Congregacional em Portugal foi fundada em Lisboa (Calçada do cascão) por volta de 1880. Dez anos mais tarde a recém-formada Missão Evangelizadora do Brasil e Portugal decidiu enviar o seu presidente honorário, Henry Maxuell Wright, logo de seguida em visita a Portugal (...). (ERICSON, Gerald Carl. Os Evangélicos em Portugal. Núcleo , Queluz, Abril 1984, pp. 38)
Sobre o metodismo colhemos os seguintes dados a respeito do seu início:
A origem da Igreja Metodista em Portugal resultou do testemunho de dois leigos ingleses, Thomas Chegwin, em 1854, e James Cassels, dez anos mais tarde. Ambos foram responsáveis pela iniciação de pequenos grupos no estudo bíblico e na oração, adoptando o modelo criado por João Wesley no seu sistema de classes.
Em 1868 foi construída a primeira capela Metodista em Vila Nova de Gaia, onde se celebraram os primeiros baptismos infantis e cultos de Sagrada Comunhão. O crescimento do Metodismo, sob a liderança de Cassels, tornou-se evidente e sucessivos apelos foram dirigidos à Sociedade Missionária Metodista, de Londres, solicitando o envio de um missionário para orientar este trabalho. O pedido acabou por ser atendido e um jovem ministro, Robert Hawkey Moreton, foi enviado em 1871.
A génese dos baptistas em Portugal está ligada à famíia Jones de naconalidade inglesa: William Jones (1762-1846), Joseph Jones (1789-1868) e Joseph Charles Jones (1848-1928). Este último é o fundador da primeira igreja baptista em Portugal, segundo escreve Herlânder Felizardo: “Jones realiza os primeiros baptismos a 6 de Setembro de 1888, organizando-se nesse mesmo dia uma Igreja Evangélica ‘Baptista’ de comunhão aberta, sendo eleito líder.” (História dos Baptistas em Portugal, Cebapes, Lisboa, 1995, pp. 11,12). O seu pai Joseph Jones “foi uma figura proeminente na vida mercantil na cidade do Porto, dado que foi um dos fundadores da Associação Comercial em 14 de Outubro de 1834, fazendo parte da primeira e subsequentes direcções, como um de entre quatro directores, conforme atestam documentos aí arquivados e a placa ao centro no primeiro lanço da escadaria do Palácio da Bolsa. (...) serviu igualmente no quadro de directores duma Companhia de Seguros “Douro”, e no Banco Comercial no Porto, fundado em 13 de Agosto de 1835. Ainda fez parte d Direcção da Assembleia Portuense, à qual pretendia dar impulso à Civilização Nacional, seguindo o exemplo que apra tal fim davam as Nações da Europa.” (Idem, p. 9)
A presença de evangélicos na cultura, na assistência social, na educação, nos negócios, na política, enfim na vida social é, desde as suas origens, muito marcante e notória. Nems empre tem sido registada e destacada como deveria, faltam estudos publicados sobre a matéria, mas isso não anula o facto em si.
As Assembleias de Deus em Portugal decorrentes do Avivamento Pentecostal na Rua Azuza nos Estados Unidos no início do século XX, surgem pela instrumentalidade de portugueses emigrados no Brasil, onde têm contacto com o despertamento espiritual que então já produzia o seu impacto na América do Sul e na Europa. Da revista Novas de Alegria reproduzimos uma breve síntese:
A Assembleia de Deus (também conhecida como Igreja Evangélica Assembleia de Deus, IEAD) é uma igrejacristã evangélica, sendo a maior denominação evangélica e pentecostal no Brasil3 e uma das maiores no mundo, sendo considerada a sexta maior cristã do mundo [carece de fontes]4 5 , contabilizando mais de 66 milhões de membros2 .
No mundo, os membros da Associação Mundial da Assembleia de Deus são totalmente autônomos e independentes, unidos apenas pela história e pelas crenças. As Assembleias surgiram simultaneamente nos Estados Unidos (1914) e no Brasil (1911) na segunda década do Século XX, se unindo por meio de uma associação na década de 80. Como uma igreja pentecostal, as Assembleias de Deus acreditam no batismo por meio do Espírito Santo, evidenciado por meio do falar em línguas.
A Assembleia de Deus chegou ao Brasil por intermédio dos missionários suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que aportaram em Belém, capital do Estado do Pará, em 19 de novembro de 1910, vindos dos Estados Unidos. A princípio, frequentaram a Igreja Batista, denominação a que ambos pertenciam na Suécia. Eles traziam a doutrina do batismo no Espírito Santo, com a glossolalia — o falar em línguas espirituais — como a evidência inicial da manifestação para os adeptos do movimento.6 A manifestação do fenômeno já vinha ocorrendo em várias reuniões de oração nos Estados Unidos (e também de forma isolada em outros países), principalmente naquelas que eram conduzidas por Charles Fox Parham, mas teve seu apogeu inicial através de um de seus principais discípulos, um pastor leigo negro, chamado William Joseph Seymour, na rua Azusa, Los Angeles, em 1906.
A nova doutrina trouxe muita divergência. Enquanto um grupo aderiu, outro rejeitou. Assim, em duas assembleias distintas, conforme relatam as atas das sessões, os adeptos do pentecostalismo foram desligados e, em 18 de junho de 19117 , juntamente com os missionários estrangeiros, fundaram uma nova igreja e adotaram o nome de Missão de Fé Apostólica, que já era empregado pelo movimento de Los Angeles, mas sem qualquer vínculo administrativo com William Joseph Seymour. A partir de então, passaram a reunir-se na casa de Celina de Albuquerque. Mais tarde, em 18 de janeiro de 1918a nova igreja, por sugestão de Gunnar Vingren, passou a chamar-se Assembleia de Deus, em virtude da fundação das Assembleias de Deus nos Estados Unidos, em 1914 em Hot Springs, Arkansas, mas, outra vez, sem qualquer ligação institucional entre ambas as igrejas.
A Assembleia de Deus no Brasil expandiu-se pelo estado do Pará, alcançou o Amazonas, propagou-se para o Nordeste, principalmente entre as camadas mais pobres da população. Chegaram ao Sudeste pelos idos de 1922, através de famílias de retirantes do Pará, que se portavam como instrumentos voluntários para estabelecer a nova denominação aonde quer que chegassem. Nesse ano, a igreja teve início no Rio de Janeiro, no bairro de São Cristóvão, e ganhou impulso com a transferência de Gunnar Vingren, de Belém, em 1924, para a então capital da República. Um fato que marcou a igreja naquele período foi a conversão de Paulo Leivas Macalão, filho de um general, através de um folheto evangelístico. Foi ele o precursor do assim conhecido Ministério de Madureira, como veremos adiante.
A influência sueca teve forte peso na formação assembleiana brasileira, em razão da nacionalidade de seus fundadores, e graças à igreja pentecostal escandinava, principalmente a Igreja Filadélfia de Estocolmo, que, além de ter assumido nos anos seguintes o sustento de Gunnar Vingren e Daniel Berg, enviou outros missionários para dar suporte aos novos membros em seu papel de fazer crescer a nova Igreja. Desde 1930, quando se realizou um concílio da igreja na cidade deNatal, a Assembleia de Deus no Brasil passou a ter autonomia interna, sendo administradas exclusivamente pelos pastores residentes no Brasil, sem contudo perder os vínculos fraternais com a igreja na Suécia. A partir de 1936 a igreja passou a ter maior colaboração das Assembleias de Deus dos Estados Unidos através dos missionários enviados ao país, os quais se envolveram de forma mais direta com a estruturação teológica da denominação.
As Assembleias de Deus brasileiras estão organizadas em forma de árvore, na qual cada Ministério é constituído pela igreja-sede com suas respectivas filiadas, congregações e pontos de pregação (subcongregações). O sistema de administração é um misto entre o sistema episcopal e o sistema congregacional, por meio do qual os assuntos são previamente tratados pelo ministério, com forte influência da liderança pastoral, e depois são levados às assembleias para serem referendados apenas. Os pastores das Assembleias de Deus podem estar ligados ou não às convenções estaduais, e estas se vinculam a uma convenção de âmbito nacional. Particularmente na América do Sul, hoje existem muitas Assembleias de Deus autônomas e independentes.
A Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) possui sede no Rio de Janeiro,RJ esta se considera o tronco da denominação por ser a entidade que desde o princípio deu corpo organizacional à igreja. A CGADB em 2000 contava com cerca de 3,5 milhões de membros em todo o Brasil (dados do Iser) e centenas de missionários espalhados pelo mundo.
A CGADB é proprietária da Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD), com sede no Rio de Janeiro, que atende parcela significativa da comunidade evangélica brasileira. À CGADB também é proprietária da Faculdade Evangélica de Tecnologia, Ciências e Biotecnologia (Faecad), sediada no mesmo Estado, e que oferece os seguintes curso em nível superior: Administração, Comércio Exterior, Marketing, Teologia e Direito. E no selo Fonográfico a CGADB é proprietária da Patmos Music gravadora que tem sede e estúdios também no Rio de Janeiro RJ, que tem em seu casting de artistas, dezenas de cantores(as).
A CGADB é constituída por várias convenções estaduais e regionais, além de vários ministérios. Alguns ministérios cresceram de tal forma que tornaram-se denominações de facto, com suas congregações sobrepondo as áreas de abrangência das convenções regionais. Dentre os grandes ministérios se destaca o Ministério do Belém, que possui cerca de 2.200 igrejas concentradas no centro-sul e com sede no bairro do Belenzinho na capital paulista, sendo atualmente (2013) presidida pelo pastor José Wellington Bezerra da Costa, que sucedeu o pastor Cícero Canuto de Lima, que também presidiu a CGADB.
Na área política, alguns deputados federais são membros das Assembleias de Deus e a representam institucionalmente junto aos poderes públicos nos assuntos de interesse da denominação, supervisionados pelo Conselho Político Nacional das Assembleias de Deus no Brasil, com sede em Brasília, DF, que coordena todo o processo político da CGADB. Além disso, há também deputados estaduais e até prefeitos e vereadores, todos sob a chancela de igrejas ligadas à CGADB. No Pleito Eleitoral de 2011, 22 deputados Federais assembleianos foram eleitos para a 54ª Legislatura (2011-2015).
Desde a década de 1980, por razões administrativas, notadamente em virtude do falecimento do pastor Paulo Leivas Macalão e de sua esposa, missionária Zélia, a Assembleia de Deus brasileira tem passado por várias cisões que deram origem a diversas convenções e ministérios, com administração autônoma, em várias regiões do País. O mais expressivo dos ministérios independentes é o Ministério de Madureira, cuja igreja já existia desde os idos de 1930, fundada pelo já mencionado pastor Paulo Leivas Macalão e que, em 1958, serviu de base para a estruturação nacional do Ministério por ele presidido, até a sua morte, no final de
À medida que os anos se passavam, os pastores do Ministério de Madureira (assim conhecido por ter sua sede embairro de mesmo nome, na cidade do Rio de Janeiro), sob a presidência vitalícia do pastor (hoje Bispo) Manoel Ferreira, (foi assumindo a liderança da CGADB, criaram de forma pretenciosa um criterio para conter essa força do ministerio de madureira na convenção geral, proibindo o ministerio de madureira de ter uma convenção nacional, pois só o ministerio de madureira tinha uma convenção nacional organizada pelo Pastor Paulo Leivas Macalão, este foi o unico pretesto criado para desligar madureira da CGADB) distanciavam das normas administrativas da CGADB (Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil), segundo a liderança da época, que, por isso mesmo, realizou uma assembleia geral extraordinária em Salvador, Bahia, em setembro de 1989, onde esses pastores foram suspensos até que aceitassem as decisões aprovadas. Por não concordarem com as exigências que lhes eram feitas foram excluídos pela Diretoria da CGADB. Desta forma tornou-se completamente independente da CGADB a Convenção Nacional das Assembleias de Deus no Brasil — Ministério de Madureira (CONAMAD), que tem no campo do Brás, na capital paulista, a sua maior expressividade, que, por anos, foi presidido pelo pastor Lupércio Vergniano e hoje está sob as ordens do Pr.Samuel Cássio Ferreira, bacharel em Direito. Possuía em 2005 cerca de 2 milhões de membros no Brasil e exterior.~
Em Portugal a história dessa denominação pentecostal é contada a partir do ano de 1913. Foram os missionários portugueses emigrados do Brasil José Plácido da Costa (1913) e José de Matos Caravela (1921) que deram início às ações que resultaram na fundação das Assembleias de Deus em Portugal.
A primeira igreja Assembleia de Deus em Portugal foi fundada na cidade de Portimão, em 1924, pelo missionário José de Matos, também responsável pela fundação das igrejas do Algarve, de Santarém e de Alcanhões. A partir desse ano, com a ajuda de missionários suecos e o esforço de obreiros portugueses, foram estabelecidas diversas outras igrejas em várias cidades, como: Porto, em 1930, com a intervenção do missionário sueco Daniel Berg; Évora, em 1932, pela ação da evangelista Isabel Guerreiro; e Lisboa, em 1934, com a ajuda do missionário Jack Hardstedt.
Da ação missionária das Assembleias de Deus em Portugal deu-se a expansão da igreja aos territórios ultramarinos, a exemplo de: Angola, Guiné, São Tomé e Príncipe, Moçambique e Timor-Leste; os quais posteriormente tornaram-se nações independentes, mas mantiveram suas igrejas Assembleias de Deus nacionais em fraterna relação com as coirmãs portuguesas.
Em Portugal o ramo principal é a Convenção das Assembleias de Deus em Portugal, com quase 400 igrejas, a maior denominação protestante no país.
Assembleia de Deus Americana Nos Estados Unidos surgiram várias congregações pentecostais independentes, desde o avivamento da rua Azuza, em 1906. Buscando unidade, comunhão entre si, trabalho missionário e organização legal, alguns líderes convocaram uma Convenção em Hot Springs,Arkansas, em 1914. Como resultado, houve a adesão de quase 500 ministros e a criação do General Council of the Assemblies of God (Concílio Geral das Assembleias de Deus), mais tarde sediado em Springfield, Missouri. Essa igreja possui, hoje, cerca de 2 milhões de membros e envia missionários a vários países do mundo. John Ashcroft, procurador-geral dos Estados Unidos durante o primeiro mandato de George W. Bush, é membro dessa denominação.
As Assemblies of God apresentam algumas diferenças de sua coirmã brasileira: no tocante à administração, não existe o sistema de ministérios; cada igreja local é autônoma e não é subordinada a nenhuma outra, mas voluntariamente agrupam-se em presbitérios regionais, onde há igualdade entre todos e contam com a participação de representantes leigos. A congregação local entrevista e contrata o pastor, que é examinado e ordenado pelo Concílio Geral. Referente aos costumes, as Assemblies of God são integradas à sociedade americana, permitindo, por exemplo, que suas mulheres cortem o cabelo e usem calças compridas.
De acordo com o credo das Assembleias de Deus, entre as verdades fundamentais da denominação, estão a crença:
- Num só Deus eterno subsistente em três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo;
- Na inspiração verbal da Bíblia Sagrada, considerada a única regra infalível de fé normativa para a vida e o caráter cristão;
- Na concepção virginal de Jesus Cristo, na sua morte vicária e expiatória, ressurreição corporal e ascensão para o céu;
- No pecado que distancia o homem de Deus, condição que só pode ser restaurada através do arrependimento e da fé emJesus Cristo.
- Arrebatamento de todos os fiéis a Deus e a Bíblia Sagrada para a Nova Jerusalém em breve com a volta de Cristo.
- Na necessidade de um novo nascimento pela fé em Jesus Cristo e pelo poder atuante do Espírito Santo e da Palavra de Deus para que o homem se torne digno do Reino dos Céus;
A denominação pratica o batismo em águas por imersão do corpo inteiro, uma só vez, em pessoas a partir de 12 anos, em nome da Trindade; a celebração, sistemática e continuada, da Santa Ceia; e o recebimento do batismo no Espírito Santo, geralmente, com a evidência inicial do falar em outras línguas, seguido de outros dons do Espírito Santo. A exemplo da maioria dos cristãos, os assembleianos aguardam a segunda vinda premilenial de Cristo em duas fases distintas: a primeira, invisível ao mundo, para arrebatar a Igreja fiel da terra, antes da Grande Tribulação; e a segunda, visível e corporal com a Igreja glorificada, para reinar sobre o mundo por mil anos, sendo portanto dispensacionalista.
Ainda, nesse corolário de fé, os assembleianos esperam comparecer perante o Tribunal de Cristo, para receber a recompensa dos seus feitos em favor da causa do Cristianismo, seguindo-se uma vida eterna de gozo e felicidade para os fiéis e de tormento para os infiéis.
Os assembleianos, em regra, são contra o aborto voluntário.
Os cultos das Assembleias de Deus se caracterizam por orações, cânticos, testemunhos e pregações, onde muitas vezes ocorrem manifestações dos dons espirituais, como, por exemplo, profecias e línguas espirituais.
Possui dias e horários específicos para cultos,que são quarta-feira e sexta-feira no horário das 19:30, sendo que o principal deles no domingo por volta das 19:00 horas, e o de ensinamento bíblico (a Escola Bíblica Dominical, com divisão de classes por idade) por volta das 8 horas.
Os cultos têm duração média de 2 horas, sendo divididos em:
- Oração inicial - Normalmente o pastor ou outro obreiro faz uma oração a Deus.
- Cânticos iniciais - Utilizando-se a Harpa Cristã, que é o hinário oficial da IEAD.
- Leitura bíblica (ou palavra introdutória) - Neste momento a leitura do trecho bíblico e inspirada pelo Espírito Santo.
- Oportunidades de cânticos por grupos de jovens, crianças, senhoras, adolescentes, corais, grupos, bandas e ministérios de louvor.
- Oportunidades de testemunhos por membros - Momento no qual os membros contam o que Deus mudou em suas vidas e vem fazendo, atualmente, por eles.
- Pregação - O momento mais aguardado do culto em si. Pois é o momento em que o pastor da igreja, ou um obreiro, até mesmo pastores convidados explicam a palavra do Senhor.
- Apelo - Convite aos que não são evangélicos a aceitarem a Jesus como único e suficiente Salvador.
- Cântico de encerramento e/ou avisos sobre as próximas reuniões.
- Oração final.
- Bênção final (somente dado pelo pastor, ou evangelista ou presbítero em ocasiões especiais).
A Assembléia de Deus vêm experimentando, recentemente, grandes mudanças comportamentais concernente a usos ecostumes. [carece de fontes] A Assembleia de Deus, há algum tempo, tinha o hábito de inserir como doutrina os usos e costumes, por meio dos quais restringia mais a liberdade das mulheres em questões de vestimenta, cabelo e maquiagem. A igreja dizia que o uso de determinadas roupas e cortes de cabelos, por exemplo, era vaidade. No entanto, com o passar dos anos, percebeu-se que a adoção ou não de determinadas regras por parte das igrejas locais tratava-se mais de uma questão de costume do que de doutrina, pois não feria os fundamentos da fé cristã.
Pouco a pouco a Assembleia de Deus está aceitando o uso de determinadas peças do vestuário feminino, consentindo que as mulheres usem calças compridas(pois em locais de trabalho lhe eram necessárias), decotes um pouco alongados ou mangas um pouco mais curtas,não sendo padrão tal costume novo.
De igual modo, tendem a desaparecer do cenário assembleiano as folclóricas proibições ao uso da televisão, que já foram liberados desde 1990 , enquanto algumas igrejas passam a orientar seus adeptos a lerem bons livros e fazerem uso adequado da internet, numa clara demonstração de que as posições radicais do passado estão sendo substituídas pelo respeito à liberdade de seus membros usufruírem dos benefícios que a tecnologia põe à disposição da sociedade contemporânea.
Ao todo, as Assembleias de Deus têm 64 milhões de membros espalhados no mundo e 363.450 ministros, divididos entre 351.645 igrejas e presentes em 217 países. O Brasil lidera essa lista com 22,5 milhões de membros, de acordo com as estimativas da igreja nos EUA.
Na América Latina e Caribe, o número de membros chega a 28,8 milhões, o equivalente a 45% do total de assembleianos presentes no planeta. Estes números são alcançados graças ao grande avanço da Assembleia de Deus no Brasil, que detém um pouco mais de 78% desse total.